

“Obrigado pelo feedback.” Quantas vezes essa frase foi dita com sinceridade? E quantas vezes foi apenas a cortesia que encerra uma conversa desconfortável? O feedback, especialmente quando envolve redirecionar ou corrigir algo, deveria ser uma ferramenta de crescimento. Porém, em muitas organizações, virou campo minado: a verdade, mal colocada, gera desmotivação, frustração e até mina a confiança de equipes inteiras.
Líderes, por vezes, confundem feedback com críticas e as fazem sem preparo, outros deixam de falar por medo da reação.. Colaboradores se fecham na defensiva, e o ciclo se repete. E porque tem sido assim? Vocês também se perguntam o motivo de um tema tão antigo ainda ser alvo de treinamentos e análises?
Uma revisão de 25 anos ( Anseel & Sherf, A 25-year review of research on feedback, 2023) concluiu que a “ciência de feedback no trabalho” ainda não é coerente, há divergências conceituais e aplicação prática desalinhada.

O desarranjo entre dar e receber feedback que observei na prática!
Em mentorias e workshops, costumo aplicar um quiz simples:
• Quem gosta de receber feedbacks, de saber mais sobre como é visto e sobre sua performance? → Mais de 90% respondeu positivamente. Ou seja, queremos ouvir ou ao menos dizemos querer.
• Quem gosta de oferecer feedbacks, dedicar tempo em dizer ao outro como o vê ? → Menos de 10% confirmam esse interesse.
Esse desarranjo é revelador: muitos querem colher, poucos querem plantar.
E quando pergunto o motivo surge a questão do quão desgastante pode ser uma conversa de feedback. Dar feedback implica preparo: pensar o que falar, como falar, em que momento. Requer tempo, coragem e envolvimento. Quem dá feedback não é um observador neutro: está implicado na cena. Além de olhar o outro, precisa olhar para si e se perguntar: “O que vi é realmente isso? Como tenho certeza?”. Esse autoquestionamento é desconfortável.
E há também o medo da reação do outro, especialmente em culturas que preferem a harmonia superficial em vez de conversas honestas.
Receber feedback: o gatilho infantil

Se dar feedback já é trabalhoso, receber também tem suas armadilhas. Nossa visão sobre feedback costuma ser restrita, quase sempre associada à correção ou punição. Muitos, ao ouvir um feedback, revivem lembranças emocionais inconscientes de correções bruscas, feitas no calor da irritação e sem contexto.
Nossa formação inicial é basicamente um espelhamento comportamental como não fazer isso ou aquilo. Muitas vezes fomos corrigidos de forma reativa naquela interação informal e cotidiana e isso deixa marcas. Assim, quando adultos recebem feedback, podem acessar essa memória emocional e reagir com defensividade, vitimização, raiva ou retraimento.

Feedback e Lifelong Learning

Falamos muito em lifelong learning como cursos, livros, MBAs, certificações e aprender com outros . Aprender ao longo da vida também é aprender nos relacionamentos, e o feedback é uma das formas mais diretas de transformar experiência em aprendizado.
Quem realmente pratica lifelong learning precisa construir a capacidade de apreciar feedbacks, mesmo imperfeitos, como gatilhos de reflexão e não como repreensão. Um processo de ressignificação pessoal de que o outro pode ser um portal para meu aprendizado, não quer dizer que a visão do outro é a correta ou completa, mas é um ponto de vista a ser considerado. Aquilo que o outro diz, talvez sozinhos não veriamos da mesma maneira e isso também é um convite à evolução!
E quem oferece feedback precisa assumir o papel de lifelong giver: alguém que encontra significado em oferecer ao outro a gentileza de seu tempo, entregar algo que pode gerar crescimento. E para isso precisará aprender como fazer, qual melhor momento.
Por que esse tema quase “secular” continua sem solução?

Resultado ruim não vem de pessoas ‘difíceis’, vem de conversas mal desenhadas dentro de culturas que toleram o silêncio ou não valorizam conversas de qualidade.
Limitações, desafios e “armadilhas” identificadas
- Contextualização e cultura organizacional: Feedback isolado, sem um ambiente de confiança e cultura que valorize o processo, tende a falhar. A cultura sustenta o método; o método melhora a conversa.
- Receptividade individual: A maneira como quem recebe percebe o feedback (sinal de crítica, avaliação, ameaça) interfere fortemente no efeito.
- Ambiguidade conceitual: As definições de “feedback” variam muito entre estudos, alguns tratam como retorno formal de desempenho; outros como micro-feedbacks do dia a dia em momentos informais.
- Medidas e metodologias: Muitos estudos são em ambientes educacionais ou controlados; extrapolar para organizações complexas exige cautela.
- Sustentabilidade do efeito: Ainda se discute se os ganhos de desempenho se mantêm ao longo do tempo, ou se “efeitos de novidade” distorcem os resultados iniciais.
Pesquisas em comportamento organizacional mostram que conversas centradas apenas em falhas pessoais geram retraimento, inibem criatividade e corroem confiança. A neurociência reforça: ameaças sociais ativam as mesmas áreas de dor física no cérebro, e o feedback mal conduzido pode ser vivido quase como uma agressão.
E aqui entra um ponto essencial: segurança psicológica. Amy Edmondson já demonstrou em suas pesquisas que ambientes onde as pessoas sentem liberdade para falar sem medo de retaliação apresentam maior inovação, engajamento e bem-estar. Logo, feedback mal conduzido não é apenas uma falha de comunicação, é um risco direto à saúde mental e à sustentabilidade da cultura.
O dilema dos métodos
Muitos protocolos foram tentados. E há desafios de entendimento sobre o que de fato é um feedback. Precisa de formalização? Uma conversa, pode ser considerada um feedback? Quais são os pressupostos que definem que foi um feedback?
Na PlenaMente, há muito tempo orientamos a formalizar a conversa informal ao menos com um fechamento de “vamos manter isso em foco, considere um feedback”, e de fato cuidar do tema no desenvolvimento da pessoa.
Como método partimos da conhecida metodologia CAR, que organiza a conversa em Contexto, Ação e Resultado. Mas percebemos que faltava algo essencial: nomear o que já está presente, mas não dito, e projetar para o futuro.
Assim, evoluímos para o CAR-SP:
• C – Contexto → situar a conversa com fatos claros e objetivos.
• A – Ação → descrever comportamentos observáveis, não julgamentos.
• R – Resultado → explicitar as consequências concretas.
• S – Sentimentos Prováveis → reconhecer os sentimentos envolvidos, que raramente são nomeados, mas estão ali. Humaniza sem dramatizar. Nomear emoções ajuda a engajar o cérebro na solução.
• P – Pedidos das Necessidades Percebidas → formular pedidos claros e positivos, que projetam o futuro. Esse é o ponto de feedforward: sair do passado e criar compromisso com o amanhã.

O Papo Aberto é nosso jeito de manter as conversas pessoais, atentos ao relacionamento.
Método sozinho não muda cultura. Por isso, o CAR-SP se ancora no Papo Aberto, nossa metodologia de conversas intencionais na PlenaMente

Seus princípios:
• Amoroso/Atento – não só a intenção genuína de construir, mas também a presença e a preparação para a escuta ativa. Um feedback só é construtivo se quem lidera também se abre para ouvir.
• Busca Aproximação – a conversa como ponte, não muro.
• Ecológico/Sistêmico – impacto para mim, para o outro e para o coletivo.
• Relevante – foco no que importa para o futuro, não em “lavar roupa suja”.
• Transparente – falar na 1ª pessoa, com autenticidade.
• Oportuno – no momento certo, evitando gatilhos desnecessários.
Já aplicamos inúmeras vezes esse jeito inclusivo de conversar, e é recorrente ouvirmos dos líderes: “Foi a primeira vez que consegui dar um retorno difícil sem perder a conexão.” Pesquisas sobre engajamento confirmam: transparência e confiança são fatores decisivos de retenção e motivação em equipes.
Alertas CNV (Comunicação Não Violenta)

• Observação ≠ Avaliação → quando formos falar do comportamento observado, devemos cuidar para não fazermos um juizo de valor do comportamento. Não sabemos a intenção da pessoa, sabemos somente a ação. Em uma situação onde a pessoa interrompeu a fala de uma colega três vezes: “três interrupções” é observável; “foi desrespeitoso” é julgamento.
• Sentimentos ‘prováveis’ → toda interação gera sentimentos, e nem sempre são expostos, pois entendemos que o trabalho não é lugar de sentimentalismos, mas eles estão presentes. Então, nomear essa dimensão sem dramatizar pode tornar a conexão mais humana.
• Pedidos positivos e concretos → nem sempre dizemos o que esperamos num próximo evento, e a pessoa que recebeu o feedback fica somente com o que não funcionar. Então poder fazer um pedido claro para que outro reflita pode ajudar. Exemplo: “esperar a conclusão da fala antes de contribuir” (o que fazer) funciona melhor que “não interromper” (o que não fazer).
Esse alinhamento aproxima o CAR-SP dos quatro componentes da CNV: observação, sentimentos, necessidades e pedidos.
Exemplo prático de CAR-SP em ação
• C: “Na reunião de ontem…”
• A: “…houve três interrupções durante a fala do colega.”
• R: “…a ideia não foi explorada e a equipe perdeu clareza.”
• S: “Eu fiquei tensa, tentando gerenciar as possíveis frustrações no grupo.”
• P: “Gostaria de pedir que, nas próximas discussões, você esteja atento a essas interrupções, para não perder contribuições completas. Isso garante clareza, respeito e melhor aproveitamento das ideias.”
Case aplicado
Uma das empresas que adotou o Papo Aberto como prática mensal em grupo e incorporou o CAR-SP conseguiu transformar tensões históricas sobre feedback em conversas valorosas para autoconhecimento, reconhecimento e mudança.
Em 6 meses, a prática foi absorvida pelos líderes — inclusive em conversas entre pares — e se tornou parte da cultura. O resultado foi observado em três indicadores:
1. aumento da percepção de segurança psicológica;
2. redução de conflitos não resolvidos;
3. maior iniciativa de melhoria propostas pelos próprios colaboradores.
👉 Resultado ruim não vem de pessoas ‘difíceis’, vem de conversas mal desenhadas.
Desafio final

Quero te propor algo prático: experimente!! E conte com meu apoio direto.
Pratique o Papo Aberto como forma de conversar e o CAR-SP como método de estruturar feedbacks por 90 dias. Observe o que muda em você, na sua equipe e na cultura do seu negócio.
Se desejar, posso te acompanhar nesse período e construirmos juntos uma nova história de sucesso.
📩 Mande-me uma mensagem e vamos conversar.
Por Ana Lícia Reis








