

Diferente do quiet quitting, em que colaboradores reduzem conscientemente seu esforço, aqui há algo mais sutil e muito mais danoso: a exclusão emocional progressiva. O profissional permanece fisicamente presente, mas já está mentalmente, emocional e simbolicamente desligado da empresa.
Li uma frase dita por Joaquim Santini, especialista em cultura organizacional, que me chamou a atenção, ele menciona que não é o funcionário que abandona o trabalho, mas o trabalho que silenciosamente abandona o sujeito. Essa imagem traduz um tipo de erosão que não aparece no dashboard, mas corrói cultura, segurança psicológica e resultado.
Presenteísmo x Quiet Cracking

Vale distinguir fenômenos próximos, porém diferentes e complementares.
•Presenteísmo: a pessoa está no trabalho, mas com produtividade e vitalidade comprometidas; pode haver adoecimento, estresse, esgotamento, confusão de prioridades. O impacto aparece na entrega visível.
• Quiet cracking: a pessoa está no trabalho, mas o vínculo simbólico e afetivo foi se rompendo. O impacto aparece no sentido e no pertencimento; na prática, isso reduz iniciativa, criatividade, colaboração e potência de decisão.
Os dois formam um campo de risco silencioso. Um acende indicadores funcionais; o outro apaga o significado. E como fazer para detectar esses sinais cedo? convide o time à reflexão. Serve para o líder enxergar e para a pessoa se dar conta.
• Quando foi a última vez que você sentiu que fazia diferença aqui?
• O que está consumindo sua energia emocional no trabalho?
Muitas vezes é o trabalho que vai se retirando da pessoa, tão silenciosamente que nem ela percebe a ausência. Essas duas perguntas iluminam o que o relatório não mostra. Um levantamento recente, no State of the Global Workplace: 2025 da Gallup, aponta que apenas 19% dos trabalhadores brasileiros demonstraram engajamento real em 2025.
Em termos simples, isso significa que, de cada 10 pessoas, apenas duas estão realmente conectadas ao que fazem, enquanto as outras oito estão no modo automático, e isso não se trata apenas de uma estatística de clima: estamos falando de times que funcionam sem energia criativa, que entregam sem entusiasmo e que permanecem sem sentir que fazem diferença. Esse vazio não afeta só a produtividade; ele impacta diretamente a inovação, a retenção de talentos e a capacidade de uma organização prosperar de forma sustentável.
O problema não é só do indivíduo

O ambiente organizacional pode perder significado quando rotinas ficam mecânicas, quando o reconhecimento não chega, quando o propósito se dilui nas urgências. Como líderes, precisamos nos perguntar, de modo direto:
• O ambiente que oferecemos inspira pertencimento ou alimenta o vazio?
• A maneira como gerimos convida ao significado ou apenas à entrega?
Há mais de 25 anos mentorando líderes em empresas nacionais e multinacionais, observo que trabalho sem conexão não engaja e liderança que não escuta perde potência. Perde-se criatividade, perde-se talento, perdem-se resultados. E se chegou até aqui na leitura espero que o próximo tópico te inspire uma nova abordagem.
O que líderes podem fazer, com cuidado e com firmeza?
1) Cultivar presença, e confrontar ausências
Presença não é só proximidade afetiva, é também nomear sinais de afastamento com fatos e respeito. Exemplos observáveis que pedem conversa: menos participação em reuniões, entregas feitas apenas no mínimo, silêncio diante de problemas críticos, perda de curiosidade e de iniciativa, atrasos recorrentes em marcos importantes, ignorar esses sinais é fechar os olhos para um problema que já está corroendo a equipe.
2) Conectar propósito às ações do dia a dia
Propósito não é lembrete institucional, é critério vivo de decisão. Perguntar em reuniões: “De que forma nossa decisão de hoje expressa nosso propósito?” Ou ainda, encerrar um ciclo de trabalho pedindo exemplos reais de quando o propósito foi vivido no cotidiano. Pequenos gestos assim devolvem energia ao time, porque mostram que o propósito não é um pôster na parede, mas algo que guia escolhas reais.
3) Treinar gestores e revisar modelos mentais
O limite de expansão de uma empresa está limitado ao modelo mental de seus líderes. Antes de cobrar engajamento, o líder precisa se perguntar: o quanto estou presente de verdade? Em que momentos opero no automático? De que formas meu estilo pode estar alimentando o silêncio do time?
Desenvolver gestores com ferramentas adequadas multiplica a qualidade das relações, mas o ponto de partida é sempre esse: a coragem do próprio líder de se olhar no espelho e confrontar suas ausências.

Em síntese
Quiet cracking e presenteísmo são sinais silenciosos, ignorá-los é caro, mas enxergá-los cedo é inteligente, essa resposta combina presença que vê, propósito que guia e liderança que se revisita.
No nível mais profundo da liderança, está o papel de reinventar o que significa estar presente.
Com mente integrativa e regenerativa, acredito que a consciência elevada é o portal de soluções duradouras. Na prática, isso se traduz em decisões que promovem cuidado, desenvolvimento e engajamento, transformando dor em potência e construindo uma cultura de pertencimento consciente.
Líderes conscientes não podem ignorar esse sinal silencioso.









